quarta-feira, abril 14, 2010

A vida nada fácil e nada simples do DJ


A noite é cheia de fascínio, charme e luzes, mas complica os relacionamentos e cansa muito. Léo Cristo, 35 anos, não quer outra vida, por enquanto.

Sobe o som: Putz – Putz – Putz – Putz – Putz – Putz – Putz – Pu – Pu – Putz... Além do som, o ambiente é meio escuro, mas cheio de jogos de luzes de diversas cores, como verde, azul, vermelho. Quantos flashes! Ah! É aquela luz que fica piscando, que faz as coisas ficarem em câmera lenta. Tem muita gente agitando, sorrindo, curtindo a música. Vários são os drinks comprados com os barmen. É isso aí, tudo com muito movimento e agitação. Mas, quem dá o ritmo da balada é o DJ.
Um destes agitadores é Léo Cristo, que há 17 anos faz seus remixes pelas casas noturnas de Santos e São Vicente. Ele é apaixonado pelo que faz e, enquanto puder, deixa claro que não vai largar sua arte.
Quando questionado sobre mudar, ele é enfático:
“Léo, você trocaria seu trabalho na noite por um em escritório?”
“Não!”
“Mas, de jeito nenhum?”
“Cara – pondera –, teriam que me pagar muito bem”.
Ele sempre afirma que curte dar movimento às casas noturnas. Fala isso mesmo tendo sofrido alguns problemas pelo que escolheu fazer. E estes problemas não são apenas coisas do seu passado. Muitas das coisas ele ainda passa.
Até hoje, Léo não casou de papel passado, mas mora com a quarta mulher. Este fato se deve, em muito por causa de seu trabalho noturno. O DJ reconhece que, na noite, muitas são as propostas que o faziam dar uma esquecida de seus outros relacionamentos. A razão: muitas mulheres, de vários tipos, de várias idades, de muitos amores. Léo toca desde seus 18 anos, e isso lhe fazia imaturo, não medindo as consequências. Acredita que era “sossegado” – ou seja, não ficava procurando mulheres - naquela época recém saída da adolescência. Só que, ao ser procurado, não resistia.
Mesmo assim, apesar de saber que já aprontou, sempre que toca no assunto frisa que respeitava suas esposas. Para ele, o problema de seus relacionamentos era o ciúme descabido, que gerava brigas e conflitos. Ele chama o ciúme desta forma por causa da forma como se dava e ainda se dá no relacionamento atual.
“A gente brigava por causa de mensagens que eu recebia!”
“Que mensagens?”
“Mensagens como as do Orkut, sabe?”
“Sei...”
“Pocha, eu às vezes nem sabia quem era...”
“E aí?”
“Aí chegou num ponto que não dava para aguentar. A gente se separava.”
Isso aconteceu nos três casamentos anteriores e ainda tem influência neste quarto relacionamento. E hoje, Léo se diz “na dele”, não aprontando mais como antes. Mesmo assim, os desentendimentos por causa da noite continuam.
Só que nada disso atinge seu amor pelo que faz. Este amor começou aos seus 15 anos de idade. Foi quando entrou em uma boate pela primeira vez. Ele recorda que, ao entrar no lugar, ficou impressionado. Enquanto seus amigos passaram a noite com mulheres, ele ficou parado, no mesmo lugar desde a chegada no recinto, olhando para a atmosfera. As luzes, o som, o movimento, tudo chamava sua atenção. Até as cinco da manhã, hora em que saiu da sua primeira balada, ele só pensou uma coisa: “de qualquer jeito, eu preciso fazer parte disso.”
Três anos depois, levado por um amigo, começou a tocar e a mandar o som das caixas para a pista. Ele era um apaixonado que não ligava para os outros, só para fazer aquilo que tinha conseguido, que desejava tanto. Ele lembra que, no início dos anos 90, a profissão de DJ não era vista como ocorre hoje em dia. Atualmente, ele vê reconhecimento, mas, quando começou, a visão deste profissional era a de bandido, de vagabundo e de coisas do gênero. Essa ideia era tão forte que, por tocar na noite, sua mãe o expulsou de casa. Só que Léo não desistiu de tocar por causa da ameaça e execução da pena de sua mãe, pois continuou tocando e continua até hoje.
Léo ainda perde momentos de família por causa do seu amor pelo trabalho. Ele tem uma filha de 12 anos, fruto de um dos seus relacionamentos anteriores, que só vê o pai aos domingos. Ele gostaria de passar mais tempo com ela, mas precisa trabalhar. Ela não entendia muito bem o porquê de seu pai não estar tão perto, mesmo nos fins de semana, quando pode ficar com ela. Contudo, como já é “grandinha”, como seu pai diz, entende que é o trabalho de Léo e já lida com a situação bem.
Você já deve ter entendido o quanto o DJ gosta do que faz. Vendo seu rosto e gestos, fica muito mais claro. Quando fala do assunto, gesticula muito, arregala os olhos, enche o pulmão para falar. E sempre com carinho.
Só se irrita em um momento com a profissão, que é no momento da comparação dos tempos – quando começou e agora. Léo disse que algo importante se perdeu no tempo. No caso, a identidade do DJ. Ele lembra que, ao começar, o DJ era o DJ de determinada casa noturna. Não ficava trocando toda noite de lugar. “Se você fosse à Capital, você iria para ouvir o DJ Tal. Você sabia que ele estaria lá e só lá. Agora, isso não acontece! Muda de DJ toda hora”, reclama. Que fique claro: ele ressalta que se perdeu a identidade, porém “a grana” é maior. Ele gosta da valorização, mas acha que a identidade é algo que falta.
Os anos têm passado. Léo sabe que, com a idade chegando, não vai ficar muito tempo nesta vida. Ele trabalha de segunda à sexta, como operador de áudio, em horário comercial. De sexta à segunda, na noite. Atualmente, ele ainda aguenta, só que percebe, logo não dará mais.
Isso nos mostra que Léo sabe que não mais aquele garoto. Agora, rugas de expressão já se formam em torno de seus olhos, que já começam a ficar fundos. Sua barriguinha saliente já sente o peso de seus anos. Ela não sai com facilidade como aos seus 20 anos. Do alto de seus um metro e setenta centímetros, seu cabelo já apresenta o desenho das entradas em suas laterais. Apesar disso, de certas marcas de expressão de quem já se aproxima dos 40, quem o vê, pela primeira vez, não diz que tem 35. Seu jeito de agir e vestir ajuda no erro de percepção. Em seu dia-a-dia, ele anda de bermudão, camiseta de times de futebol e bonezinho. Tem um jeito meio “malandrinho” de falar e gesticular.
De qualquer modo, ele já não se considera tão novo para dois trabalhos, principalmente como DJ. Ele entende que seu corpo vai aguentar até certo ponto. Para ele, não parece ser tão fácil de afirmar isso, mas sabe que é fato e que não tem para onde correr.
Ele já pensa no futuro. Sabe que vai ter de dar um jeito de ganhar dinheiro, sem ser como DJ. Ele não quer sair, mas o tempo o fará sair de diante das caixas de som. Sobra-lhe esperar por aquele emprego de escritório que, espera, pague-lhe bem, ou seja, o suficiente.
Até lá, ele continuará fazendo o som subir. O Putz – Putz vai continuar na batida de Léo Cristo.

Michael Gil

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